OS ENSINAMENTOS DO FUTEBOL
Nos últimos tempos, o futebol passou de ser o maior entretenimento do povo brasileiro para ser fonte de grandes ensinamentos. Fazendo um retrospecto, podemos começar lá de trás, com o impacto que tivemos ao sermos eleitos sede da Copa de 2014. Duvido que a maioria não tenha sentido uma pontada de orgulho e alegria, afinal, somos ou éramos o país do futebol.
De lá para cá, muita coisa mudou. As questões políticas e financeiras apareceram, assim como as guerras de poder entre as instituições, o desagrado e o desagravo do povo, o orgulho ferido e acima de tudo muita humanidade.
Uma humanidade vista nos movimentos populares, que carregavam a dor e a preocupação de que a alegria de uns não se tornasse a desgraça de outros. Na autoestima de um jogador que ao invés de “dar uma banana” e responder com violência aos seus agressores prefere comer a banana; na sensibilidade de outros jogadores que demonstraram que são humanos e tem medo; nos atos de solidariedade, de agressividade e nas humilhações públicas. Abrir cada um destes tópicos daria uma tese.
Mas, e o que quer dizer de tudo isso? Acho que em primeiro lugar, esse cenário mostra que os seres humanos são movidos pelas suas emoções, sejam boas ou ruins, e muitas vezes aprendem e desaprendem através delas, mais do que com qualquer tratado científico. As emoções evocam memórias, que são intelectualizadas e armazenadas para justificar os nossos atos, nos defender do indefensável sentimento de separação. Quando milhares de pessoas entram em transe para agredir o outro, mesmo alguém considerado réu culpado, fica claro o espelho da coletividade, a interdependência que nos faz trocar rapidamente de papéis sem que estejamos conscientes disso, e como determinadas energias contagiam o todo rapidamente, porque despertam algo nas pessoas que elas mesmas não reconhecem.
No caso da Patrícia do Grêmio, me peguei pensando como ela seria no dia-a-dia. Será que ela realmente é uma moça cujas crenças e atitudes não são as consideradas politicamente corretas ou, de repente, é uma pessoa que tenta o tempo todo ser boazinha, engole muito sapo, e num momento de dia de fúria acaba fazendo um desabafo no outro, a plenos pulmões, e é pega em flagrante pelas câmeras virando uma vilã nacional? Como muitos sabem, o que mais tentamos evitar, normalmente, vira o nosso grande algoz. Também me pergunto, quem num momento de muita raiva não teve vontade de xingar o outro? O clichê “quem nunca pecou que atire a primeira pedra” continua válido ou alguém acha que evoluímos muito?
Nestes momentos, onde bons viram maus e vice-versa, eu penso que está na hora de mudarmos nossa cultura de punitiva para a corretiva. A punição nos faz sentir culpados de uma forma que deixa marcas emocionais doloridas e profundas, nos faz sentir raiva de nós mesmos e do mundo e, assim, só conseguimos reagir com mais raiva. A correção deve nos ajudar a compreender a forma com que interagimos no mundo. Deve ensinar o caminho do autoconhecimento, para que possamos entender o que nos leva a determinadas atitudes como indivíduos interdependentes. Só é possível uma mudança real através da correção feita a partir do reconhecimento de quem somos. É preciso assumir a autoresponsabilidade pelas próprias ações e entender como ela afeta o todo.
Não precisamos lidar com o reconhecimento das nossas qualidades, boas ou ruins, como um jogo de prós e contras, mas como uma sinfonia da qual todos os instrumentos e todas as notas musicais fazem parte. Se uma nota desafina ou sai do compasso, nós a arrumamos. Não jogamos ela fora, assim como deveríamos fazer com os nossos jogadores e torcedores.
A era da materialidade também desenvolveu a busca por resultados, pelo forte e pelo perfeito. Idealizações que tem nos afastado da nossa humanidade, que é o que temos de mais belo.
Corrigir dá mais trabalho do que punir? Talvez e, provavelmente, demore mais tempo e custe mais energia, mas o seu resultado é mais duradouro e efetivo. Causa uma verdadeira transformação.
Preferia ter visto um abraço de reconciliação entre o Aranha e a Patrícia do que tudo o que li, vi e ouvi nos últimos dias. Ao martirizarmos alguém achamos que minimizamos nossas culpas, mas apenas criamos causas para o nosso próprio sofrimento. Está na hora de pararmos de acusar o outro para nos sentirmos melhores e promovermos a nossa paz interna, que é o que interessa a todos neste planeta.
Gratidão ao futebol que nos separa em times, nos une em humanidade e, desta forma, muito nos ensina.